domingo, 29 de dezembro de 2013

Remandando


Remando contra a maré
Ré mando contra amar é.
Dó e Ré é.
Sol não.
Só apagão.
Só há pagão imposto no meio da multidão.

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Entre Tanto

Há um laço bem dosado
- providência de minhas mãos -
entre as madrugadas e a chance
com as palavras.
Não me ponho em mim
com o mesmo esmero.
Cresço o perigo de turvar
os caminhos que me chamam.
Como assombro o que há por trás
do que repito no espelho.

domingo, 8 de dezembro de 2013

Rojão no céu

Atravesso a Marques da Silva
como de costume depois paro pra um café.
as buzinas ferozes da segunda-feira,
o som tumultuado das pessoas
me tiraram da cama mais cedo.
Mas quando eu era criança
havia outro modo que despertava o dia:
minha mãe ligando o rádio
o grito do chocalho e a voz de Zé do Rojão
‘acorda minha gente’ e recitava Zé da Luz:
“três muié, três irimã, três cachorra da mulesta
eu vi num dia de festa, num lugar Puxinanã...”
Meu pai cutucando o meu dedão do pé:
tá na hora de levantar, mocinha
pra não perder a escola.
Meus pais se foram, o rádio aquietou-se de velho.
Eu e um poema de Zé da Luz ficamos atônitos
no meio da praça
quando ouvimos o barulho do Rojão subindo ao céu.

Avistamentos

O pescador lança a rede, visto de longe boneco ele.
Aqui da borda penso mais fundo, lanço minha rede.
‘Anêmona’. Falo.
E não há como tirar-lhe o nariz.
Assim ainda pertence ao mar
seus dialetos confundíveis, ardem os olhos,
curam cortes na pele e acima de tudo, afogam.
À profundidade transparente arrisco molhar o bico:
As anêmonas, eunucos invertidos,
a parte decapitada que nadou a vida
quando lançada ao mar - Terra de águas vivas.
Terra que ninguém anda. Só nada ou boia.
O MAR agora é RAM,
volátil, esgota-se no litoral, silenciado.
Primeira concha acolhida por meus dedos
e que guardo no bolso pra mostrar o mar calado
no enfeite da parede.
Tomo o cajado e vou varrer meu terreiro.
O vizinho desligou Sebastian Bach,
a porta bateu com o vento forte.
Estou lá dentro e vou andar no amor
mais raso, corriqueiro saindo das torneiras
da vida doméstica e de pouco sal.

sábado, 7 de dezembro de 2013

A Criada

Escuta este gole de cerveja
e engole comigo, no fundo,
a tua astúcia, teu modo sorrateiro
de evitar placas de incêndio.
Escuta o gole dos surdos trovões,
tiros e culatra...
tiros, ecos lá atrás...
sente o som do gole
desse amor desmesurado
e que nasceu por aí...
de alguma fala confortável de tua parte.
De algum espírito que ronda o corpo.
De ideia criada.
Mas criada não tão criada quando criada.


segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

O que se pode dizer

Os homens estão para as máquinas
assim como as árvores estão
para os desmatamentos.
Poemas tossem debaixo dos tapetes
encostam a cabeça nas mãos.
Olho de horizonte inspirado, corajoso.
Espia nas fechaduras a afonia das gravuras.
Fotografias registradas por festivais,
que acontecem ali e lá.
Ouvem de pensamento grandes entrevistas
onde o vento faz a curva de costume.
O vizinho que repara bem se unhas polidas cavam...
se o sangue branco jorra mesmo pelos canos.
O ralo ensaia dimensão e a poesia
atira-se pela porta dos fundos - assim se soube -
nem parou pra almoçar.
Quem ganhou corpo no papel foi o poema tosco,
desdentado e só.