domingo, 17 de abril de 2011

Fotos de um agosto reveladas em abril (Marta Eugênia)

A madrugada desliga brinquedos
e o silêncio pega a noite pra pensar.
Clico com os dedos, ponho palavras em poses.
Mas vem do ouvido da janela o ofício de um galo
que não se quer esquecer.
Era uma vez um galo lusitano numa lata de azeite
que veio pra cá há muito tempo daqui. (eis um close)
Era outra vez tia Cococa numa cozinha distante
rodelando o vermelho dos tomates e o branco das cebolas,
em paciência, sobre alfaces na travessa:
"Pedro não vem comer por estas bandas hoje não".
"Azeite!" (voz do tio Zacarias)
Azeite e Aceite é a mesma coisa mesmo em línguas diferentes.
(eis um zoom)
Minha forma inventada por meus pais inaugurou-se num agosto
no ano de sessenta e cinco, bem no dia vinte e dois.
Por isso gasto os folclores, fados dançam meus nervos,
sacis seduzem marchinhas, fui anjo de procissão,
mas perdi meu catecismo pra foto da comunhão
e o padre ralhou comigo.
O meu primeiro poema já sabia olhar pra trás,
uma saudade danada de tudo que carecia
do olho vivo de palavras pra poder mexer no tempo
sem virar estátua de sal.
e de tudo que escrevo há um traço indefeso
dos retratos.

Um comentário:

  1. Acabei de roubar o seu assomo saudosista. Ele já está na minha página. Parabéns! Este é mais um poema que corrobora o seu talento. Abçs!!

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